sábado, 5 de julho de 2014

Barreiras BA - História



BARREIRAS -  (Outro relato do Pastor Pita extraído do livro Por que Mudei de Exército). 
Ninguém jamais pode imaginar a imensidão que é a parte pertencente ao Estado da Bahia, no médio São Francisco e seus afluentes. Iria gastar dois meses nesta incursão. Entre os lugares que tinha que visitar, estava incluído um grupo de interessados em algum lugar chamado Rio Arrojado. Comecei esta viagem saindo de Juazeiro muito fraco, pálido e abatido, depois de vinte seis dias de lutas contra o impaludismo.

Viajamos a bordo do vapor Siqueira Campos, da navegação baiana do São Francisco. Depois do oitavo dia de viagem, alcançamos São José do Campo Largo, onde deixamos o barco, rumando para Riachão das Neves, trinta quilômetros para o centro.

O único meio de transporte arranjado foi o carro de boi. Saímos pela manhã, só à tardinha alcançamos Riachão das Neves. Aí encontrei um animado grupo e dois rapazes me levaram em montaria até um lugar conhecido como rio de janeiro, uma difícil jornada a cavalo por doze léguas, quase sem moradores.

Passei alguns dias aí, de onde saímos a cavalo mais quinze léguas até Barreiras. O grupo dos Gerais era mais forte que o de Riachão das Neves. Todos esses irmãos estavam convidados para um congresso em Barreiras e já havia recrutado alguns rapazes para colportagem.    

Das margens do rio de janeiro, na região dos Gerais, chegamos a Barreiras, onde arranjamos um salão para as reuniões.

Tínhamos poucos adventistas em Barreiras. Daí fomos ao Sítio Rio Grande. Lá, tivemos algumas reuniões na casa do irmão João José de Sousa, onde ajuntavam os adventistas da vila.

Viagem de ReconhecimentoFizemos planos para a imensa travessia.

O irmão João emprestou-me um animal para montaria. Acompanhou-me até uma fazenda chamada Forquilhinha, onde havia um professor municipal de nome Moisés Carneiro, estudioso da Bíblia e das doutrinas adventistas. A viagem do sítio até Forquilhinha foi de trinta quilômetros. Notei que o professor era homem inteligente e tinha desejo de se tornar adventista.

Na manhã seguinte o irmão João voltou a sua casa depois de dar-me instrução para o restante da viagem, naquela época infestada de onças pintadas, e também se perdesse a trilha estaria num ermo para nunca mais ser encontrado. Confiei inteiramente em Deus. Salmos 48:14 “Porque este Deus é o nosso Deus para sempre; Ele será nosso guia até a morte.”.

Era confiado nesse guia que eu estava ali e Ele já havia me preparado uma boa contribuição. Um homem havia se mudado da região de Santana dos Brejos para o Sítio Rio Grande e trouxera seus pertences num carro puxado a bois. As rodas do carro deixaram sulcos fundos na areia; uma trilha que serviria de guia e por ela viajaria dois dias.

Tomei a trilha, só Deus, guiando-me pelos sulcos deixados pelo carro de bois. Ao meio-dia dei com uma morada chamada Largo, já tinha vencido cinco léguas. Nessas viagens temos que levar alimento para toda a travessia. A esposa do irmão João, preparara uns alforjes, carne, arroz, farinha de mandioca e rapadura. No Largo, o pessoal me tratou muito bem. Cozinharam o arroz para meu almoço.

Após a refeição, tomei outra vez a trilha do carro de boi, e ao por do sol, cheguei á Fazenda Formosa.       

Adiando a festa -  Era o dia 13 de junho de 1947. Havia muita gente neste lugar. É o dia que o católico festeja Santo Antonio e teria festa com danças.
Informei-me do Sr. Romão, um octagenário, sobre Inhaúmas e uns adventistas, um povo que guarda o sábado.

Ele me disse não só conhecer, como ser amigo, acrescentando:

- Os sabatistas são gente muito boa e têm uma vida muito diferente da nossa. É pena que o Sr. Irineu já é morto, há mais ou menos dois meses.
Depois o Sr. Romão que era o chefe da família ordenou aos músicos  - acordeom, pandeiro, reco-reco e ganzá:

- Hoje não haverá danças aqui, nem bebedeira; este moço é da religião de seu Irineu e eles não gostam disso. Deixem tudo para amanhã, depois que ele for embora.

Dirigindo-se para mim:

- O senhor fala hoje para nós, daquilo mesmo que seu Irineu falava?

Concordei, e à noite, embora muito cansado pelo dia inteiro de viagem, falei a todos sobre a bendita esperança do evangelho, havia cerca de sessenta pessoas.

“...Depois de morto, ainda fala” Heb. 11:4. O comportamento dos crentes de Inhaúmas, segundo o relato do Sr. Romão sobre o falecido irmão Irineu, me animou a prosseguir viagem.

No dia seguinte me entregaram a montaria pronta com todos os arreios, e outra vez na trilha, agora de mais carros de bois dos que vieram carregados de rapadura para vendê-las na festa do Sr. Romão.

Já à tarde alcancei a casa do falecido Irineu. Era nas proximidades da vila, a uns doze quilômetros, Engenho do Sossego.

Que maravilha de Deus, que glória, que poder dos céus! Embrenhada no deserto do sertão da Bahia, uma linda Escola Sabatina, toda atualizada. Havia seis anos que Irineu tinha se transferido para Inhaúmas. Começara um trabalho local a oeste da União. Este é um dos mais escondidos. Jamais um obreiro tinha ido ali. Não por negligência, mas pela falta de homens para atender a todos os chamados.

Não irei longe. Havia trinta pessoas prontas para o batismo. Lembro-me que um garoto de nome Jaime Pereira dos Anjos passou a carta missionária com tanta perfeição como poucos da cidade. Usavam uma lição que tinha sido passada três trimestres.

Caro leitor, não se dê por enfadado com esta narrativa um pouco insossa, pois no fim esta histórica viagem, que é a chave que abriu a porta para a obra do Mestre no médio “Nilo Brasileiro”, é de alto e nobre significado.
Ao fim da viagem contaremos, sobre conversões maravilhosas e providências do céu.

Irineu já era falecido, como disse; sua esposa, irmã Emiliana, era uma cristã das que iremos encontrar na eternidade. Tinham dezessete filhos adventistas, nesta época. Dirigia ela pequena fazenda e um engenho de fabricar rapadura.

Voltaremos a falar depois sobre o Arrojado, como chegou ali o evangelho. Só quero acrescentar que todo o grupo era de quase cem interessados dos quais quarenta pediam batismo, ninguém batizado ainda. Voltamos do Arrojado com a missão cumprida. Chegamos a Barreiras para aguardar a chegada dos obreiros para o congresso e o curso de colportagem. Para realizar esta façanha, havia viajado oito dias embarcado em navio fluvial e duzentos e cinquenta léguas em lombo de burro.

Gastei ao todo quarenta e cinco dias, por isso digo; a beleza desta narrativa está na formidável viagem começada em Juazeiro até as margens do rio Corrente.

Descobri haver pouco mais de duzentos adventistas batizados e perto de cem pedindo o batismo. Havia cinco anos que não passava ali um obreiro.

Vamos ao congresso; chegaram os Pastores Paulo Seidl e Jonatas Jeremias de Oliveira, o primeiro congresso da jovem Missão.

Falei ao Pastor Paulo Seidl sobre a possibilidade de começarmos a mandar alguns jovens ao nosso colégio recém-criado em Caparaó, Minas Gerais. Os arranjos foram feitos e mandamos os irmãos de sangue Isaque e Angelina Fonseca, ao colégio. Arranjamos três colportores; assim estava lançada a sorte da Nova Missão.

Voltei a Juazeiro para buscar a família e fixar residência em Barreiras. Entre choros e lágrimas dos novos conversos em Juazeiro, deixamos a cidade. O distrito estava aberto com uma congregação de quarenta e cinco almas.

Oito anos depois voltei com toda a família para residir e construir a igreja.

Tinha sobre os ombros a responsabilidade do Departamento de Publicações e mais o novo distrito de Barreiras. Três meses eu recebia salário da Missão e outros três colportava para me manter, porque o orçamento da Organização não suportava tanto gasto. Residia a mais de oitocentos quilômetros da sede da Missão. Assim fiz durante os anos de 1947 e 1948.

Naquela época não havia transporte rodoviário em Barreiras, fora o fluvial até Juazeiro ou Pirapora, era lombo de burro ou a asa do avião. A cidade mais próxima onde tínhamos congregação era Sítio do Rio Grande, a quarenta e oito quilômetros.

Possuíamos uma considerável fortuna, economias da venda de livros, cinco mil cruzeiros velhos. Com esta economia, comprei montarias e arreios para atender as longas viagens. Voltamos então a ficar pobres novamente, porque o salário era tão pequeno que mal dava para viver, mas o trabalho era tão nobre que valia o sacrifício. Eu pergunto: qual o pioneiro que não passou por duros golpes financeiros?

Estávamos fazendo pioneirismo.      

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